3 de abril de 2018

Viagens por Maruim - Uma Nova Esperança | Por Hefraim Andrade

Anteontem, no domingo, eu e alguns colegas, atravessamos a BR 101, que corta a cidade, e seguimos em direção à antiga estação de trem. Nosso principal objetivo fora tirar algumas fotografias do rio Ganhamoroba em seu percusso, para tentarmos evitar a sua degradação e poluição, que, por sinal, não são pequenas! 

Foto: Acervo Hefraim Andrade 
O rio vive o seu pior estágio. Em suas margens é derramado o sangue do abate de animais e jogam ali muitos ossos. Em certo trecho há uma quantidade tal, que por conta do mal cheiro, atrai uma absurda nuvem de urubus e alguns cães. - A sensação de ter visto isto é a mesma de ver o enterro de alguém muito querido! Incomodou-me muito! Vivi parte da minha infância naquele lugar e lembro-me ainda do contentamento que tinha quando chegava ali nos anos 90: Primeiro, topava a linha férrea e apressava-me para caminhar sobre ela; ficava próximo de onde banhava-me. Parecia um sonho! Imaginava mil coisas…  Lembro-me também de ver algumas senhoras lavando roupa debaixo da ponte. Literalmente perdia-me observando o local, às águas… 

Saímos da estrada e descemos por um caminho estreito. Atravessarmos o passadiço (quem nunca passou por um passadiço não sabe o que perde! Esta é uma experiência legada apenas aos que viveram ou vivem no interior!), e em baixo duma árvore de jamelão (Sizygium cumini) chupamos alguns frutos maduros. Tínhamos chegado à primeira parte do rio a ser explorada. Neste ponto, as águas estavam tão transparentes que víamos muitas pedrinhas no fundo. - Não há como descrever todas as sensações que sentíamos naquele momento. Eu mesmo fiquei Lost (perdido) ouvindo e vendo às águas correndo… Agora creio ter entendido um pouquinho do que a poetisa sergipana, Jane Guimarães, quis dizer em seu último livro—Memorial de Afetos (2017), quando, num de seus poemas, fizera uso do termo “indizível” para definir o que sentia! Às margens do riacho, três do grupo subiram numa árvore cujos galhos passam sobre ele. Aquela atmosfera, acreditem ou não, chegava a entorpecer! Um colega e eu pudemos ver até orquídeas no tronco dum jenipapeiro (Genipa brasileira). É difícil de crer que um lugar como esse ainda resista na Maruim atual, não é mesmo? 

Foto: Acervo Hefraim Andrade 

Sou fã da série Star Wars desde que conheço-me por gente e quem dera pudesse tê-lo sido a ponto de ter todas as miniaturas de seus personagens que vinham dentro duma caixa de cereal cuja marca não recordo-me! Na trama, vemos a República Galáctica ter sua paz e estabilidade ameaçadas pelo lado sombrio da força, que chega ao seu ápice no Episódio III, - A Vingança dos Sith, onde a República chega ou fim e quase todos os Jedi são exterminados. Nitidamente isto significava o fim duma boa era e o início de um período sombrio, que seguiria paralelamente com o amadurecimento do jovem Jedi Luke Skywalquer, enfatizado no episódio V – Uma nova Esperança; Luke é único capaz libertar a Galáxia das Forças do Império. - Fazendo uma analogia, nossa cidade geograficamente estratégica, chegara a ser a principal fonte de receita da Província e o município de maior arrecadação. (CRUZ E SILVA) Porém, com a abolição da escravatura e consequentemente com o declínio da produção açucareira, todo o encanto começou a minguar. Os barcos a vapor e os saveiros foram desaparecendo do rio Ganhamoroba. No século XX, a construção da “Ponte do Rio que cai”, - a ponte que liga Maruim à cidade de Laranjeiras, fizera com que o processo acelerasse, reduzindo Maruim ao que conhecemos hoje. - Recordo-me da última vez que vi barcos e saveiros ancorados próximos ao bar do senhor Albertino. Eles vinham para a festa do Bom Jesus dos Navegantes que, com o tempo, também deixaram de vir. E mesmo depois de tanto tempo e passados tantos acontecimentos, não atribuo a totalidade do que obtivemos ao homem, pois não fora ele somente, mas também o rio, o responsável pela história duma cidade e de seu povo.

Foto: Acervo Hefraim Andrade 

Mais do que ninguém acredito no potencial dessas águas e talvez, quem sabe, a nossa esperança esteja contida nuns tão escondidos e esquecidos braços deste rio! Tenho certeza de que podemos atrair tantos turistas que encantar-se-iam muitíssimo com as paisagens. Atrairíamos biólogos, até porque é perceptível a grande quantidade de oitizeiros (Licânia Tomentosa) nativa da Mata Atlântica, que remanescem aos arredores do trajeto que fizemos; e mesmo de historiadores. - Temos uma igreja de 1742 em nosso território! Preciso dizer mais?!

Enfim. Nada há de pagar o que vivi ali com meus colegas. Nada há de pagar tudo o que colhi, de experiências a fotografias, com as quais daremos início a um trabalho de formigas. Contudo, não lutamos por coisas vãs, mas pela sobrevivência da memória! Creio que uma Nova Esperança apareceu-nos, sinalizando que Maruim não está totalmente perdida. Fiquemos, pois, com aquilo que diz um texto sagrado judaico: “Para uma árvore, há esperança, pois, se ela for cortada, florescerá outra vez, e seus ramos continuarão a crescer. Ainda que suas raízes envelheçam no solo e seu tronco morra no chão, ainda assim com o aroma da água brotará e lançará ramos como uma planta jovem.”. 


Até a próxima.


Fontes: 

CRUZ E SILVA. Maria Lúcia Marques. Inventário Cultural de Maruim. Edição comemorativa aos 140 anos de Emancipação política da Cidade. 1994. Aracaju-Sergipe.

GUIMARÃES, Jane. 2017. Aracaju – Sergipe.


 

| Hefraim V. Andrade nasceu em em Aracaju em 1991, membro duma família oriunda da cidade de Riachuelo - SE e de origem judaico-sefardí, que mudara-se para Maruim nos anos 70. É ativista em defesa de Israel e dos Direitos Humanos Universais. Ocupa a cadeira de número dois da Academia Maruinense de Letras e Artes - AMLA. Também Faz parte do Cumbuka Coletivo Cultural, - Grupo apartidário que vem promovendo eventos socioculturas  e de incentivo à sustentabilidade no Município.  Quanto a sua vida na escrita, ela começa na sua infância e passa por sua adolescência e juventude, quando fez parte de eventos de caráter poético e estende-se até os dias atuas indo da sátira ao que se pode entender, por ele mesmo por "formal". | 


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